Doki-Doki! 3 - Odiamos Educação!
[link—standalone]O terceiro episódio do Doki-Doki! foi completamente temático, do começo ao fim. Li alguns livros diferentes, mas decidi comentar daqueles que eram relacionados com educação, de alguma forma. O formato mudou, como prometido no último, e não gravei em uma só take, o que facilitou minha vida bastante, ainda que tenha tido o lado ruim de perdermos a música de fundo. Adicionei uns midis para transições de livros, talvez isso compense?
Os livros foram de autismo extremo, com o Caplan, para abstrações com o Illich e também com descrições históricas com Leonard. Minha ideia aqui foi tentar entender melhor o funcionamento real, afinal por aqui somos maquiavélicos, da educação, e o melhor lugar para começar me pareceu ser um livro de um economista falando de gastos e rendimentos — a abordagem mais pragmática.
Mas e as motivações ideológicas? Justamente por sermos maquiavélicos por aqui, entendemos que boa vontade não faz política, e na nossa oligarquia as coisas não funcionam propositalmente, mantendo o sistema educacional como uma ferramenta de demagogia. Para isso, os livros de Illich, Rothbard e Gatto.
Por fim, de onde surgiu a ideologia e a política envolvendo educação? Naturalmente, do século XIX, dos prussianos e dos progressistas americanos. Para isso, li algo mais próximo dos meus interesses e da nossa realidade — Illiberal Reformers de Thomas Leonard. O movimento progressista endeusou o projeto educacional, mas como eles surgiram e quais seus objetivos? Lendo o livro, apesar de ficar claro que não temos hoje os mesmos progressistas de 150 anos atrás, a ideologia deles ainda continua em seu âmago a mesma, querendo homogeneizar a população.
Aqui a lista de livros:
- The Case Against Education (Bryan Caplan):
- Deschooling Society (Ivan Illich:)
- Dumbing Us Down (John Taylor Gatto):
- Education: Free and Compulsory (Murray Rothbard):
- Illiberal Reformers (Thomas C. Leonard):
Assim como o já comentado livro de Caplan The Myth of the Rational Voter, este é extremamente focado em "economês" e trata o problema da educação da maneira mais distante e impessoal o possível, ao mesmo tempo em que Caplan se coloca como uma pessoa diretamente influenciada pelo sistema educacional. Ele é um professor, e tem um incentivo muito grande para manter as coisas como estão, mas não é o que a ciência econômica mainstream indica que deve ser feito. Ele utiliza da teoria econômica de sinalização como principal ferramenta, e faz total sentido para pessoas honestas que pensam "eu não estou na escola/universidade para aprender, mas para conseguir meu diploma."
Illich foi um padre católico associado aos movimentos sociais americanos dos anos 60 e 70 — ele era de esquerda. Naturalmente, faz uma crítica muito mais humanista ao sistema educacional e, como quase todos de esquerda, em vários aspectos não compreende o funcionamento real do mundo. Dito isso, é um livro muito bom com críticas genuinamente boas ao que o sistema educacional faz não só com as pessoas em nível individual mas também com culturas inteiras. O apelo do livro é diametralmente oposto ao de Caplan — não estamos falando em eficiência ou em quantidades, mas em valores e morais e no conforto da alma. Algumas de suas sugestões, como "redes de aprendizado", se tornaram tão práticas que no mundo de redes sociais elas parecem óbvias. É um livro sugerido pelo Pedro Sette-Câmara.
Esse livro já tinha me sido sugerido diversas vezes, e eu entendo perfeitamente por que. Gatto tem a experiẽncia de quem trabalhou diretamente com educação, mas ao mesmo tempo a honestidade de quem não quer vender a própria alma. Precisamente por ter trabalhado na máquina burocrática, as críticas que ele faz ao professor são devastadoras. Uma coisa em comum em todos os livros que falavam diretamente de educação e bastante frisada aqui é a ideia de que não se precisa de mais educação, e sim de menos. Esse livro mostra exatamente que o sistema educacional é planejado para ser danoso, e não hesita em listar os propósitos dele, por que professores e burocratas agem como agem em relação ao tema, e como de fato ele age nos alunos.
Rothbard escreve de uma maneira extremamente autista e acadêmica, o que me incomoda em quase todos seus livros, mas esse aqui tem a vantagem de ser incrivelmente curto. Não é um grande livro em nenhum sentido, mas ainda desenha muito bem, a partir daquela perspectiva individualista libertária, o funcionamento da educação em nível individual, que é o que acontecia na América por toda sua tradição até a perversão das influências alemãs/prussianas vindas a partir dos acadêmicos. Ele fala de como a educação deixou de ser livre na Europa (em particular na Alemanha, na França e na Inglaterra) e faz a análise histórica convergir com sua análise de incentivos desses projetos, que querem fortalecer estados ao diminuir indivíduos.
De longe o livro mais histórico desse episódio. Dividido em duas partes, Illiberal Reformers mostra como os especialistas/intelectuais conseguiram se tornar uma classe especial na sociedade americana e criar o movimento progressista, e também o que eles fizeram após chegar ao poder. O que move o movimento progressista é o entusiasmo com a ciência (na época, as teorias darwinistas) e a vontade de estabilizar a sociedade, evitar crises. Para isso, a ferramenta é homogeneização social, que no século XIX e começo do XX tinha significado biológico e darwinista. A principal ligação entre o progressismo antigo e o moderno não se dá nas opiniões sobre tópicos individuais, mas no objetivo maior de ordenar a sociedade e tratá-la como uma indústria ou como uma máquina. Apesar de inicialmente o objetivo do movimento progressista ser relativamente compreensível, a paranóia com crises e transformação de estabilidade no maior, senão único valor, a ser buscado se elevou a níveis absurdos contemporaneamente. E esse livro conta a história da origem disso tudo.
Talvez eu grave um outro sobre livros que não cabiam em episódios temáticos, ou eu simplesmente descarto essa ideia de episódios temáticos no futuro. Mas acredito que de qualquer forma, está melhor do que simplesmente não fazer.
Eu sugiro todos os livros desse episódio. O que menos gostei foi do Rothbard, mas mesmo ele tinha algo a ser retirado.
Até a próxima, amigos.